segunda-feira, 23 de março de 2009

MATÉRIAS-PRIMAS UTILIZADAS PARA PRODUÇÃO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS

A composição química de qualquer que seja o material utilizado para obtenção de destilado alcoólico varia em muitas propriedades. Isto ocorre em função de muitas variáveis, algumas controladas pelo homem e outras não. Das variáveis não controladas, destacam-se as influenciadas pela região de cultivo, pelo clima local, pelas propriedades do solo, entre outras. Já as controladas pelo homem dizem respeito à variedade da planta utilizada, do tipo de colheita (mecânica ou manual), do tempo de maturação após a colheita, às condições de transporte, armazenamento e industrialização.
1. Cereais
Os principais cereais utilizados para a elaboração de destilados alcoólicos são: cevada, cevada maltada, arroz, milho, centeio e sorgo. Estes cereais diferem entre si principalmente pela composição química e conseqüentemente pelas características que proporcionam ao produto final. Em se tratando de whisky tipo escocês, a cevada maltada é a principal matéria-prima utilizada, no entanto, para os whískies americanos o milho é o principal ingrediente. O constituinte básico de todos os cereais é o amido, a escolha então é praticada pela qualidade do produto que se deseja obter, pelo rendimento em função do percentual do amido no cereal, pelos custos da matéria-prima e custos operacionais. Os vários fatores que podem influenciar na composição química dos cereais dificultam sua caracterização e com isso causam divergências nos dados encontrados na literatura. Na Tabela 1, estão ilustrados alguns dados conforme Andreasen 1982. Todos os valores são dados em base seca. De acordo com os dados apresentados na Tabela 1, fica fácil perceber que um mesmo cereal apresenta composição química diferente entre si em função do tratamento dado à matéria-prima de origem. É o que ocorre na cevada maltada que apresenta, por exemplo, percentuais de amido inferior ao apresentado no cereal de origem. Essa diferença se dá em função do processo realizado de maltagem.
2. Cevada
A cevada é um cereal que pertence à família das gramíneas. De origem antiga, a cevada possivelmente já era cultivada por civilizações da Era da Pedra, na Ásia ou Etiópia. Atualmente existem mais de 4000 variedades ao redor do mundo, no entanto, nem todas são comercialmente viáveis. Há um grande esforço por parte dos produtores do malte e das cervejarias em desenvolver um malte com características que possam melhorar o perfil aromático e o sabor das cervejas. Para os produtores de destilados, o interesse está concentrado em desenvolver maiores níveis de enzimas específicas para a degradação do amido em moléculas de maltose e glicose, o que proporcionará maiores rendimentos alcoólicos. O percentual de amido varia de cereal para cereal. No malte de cevada é menor do que no milho, e conseqüentemente propiciará menores rendimentos alcoólicos. Em contra partida, o malte de cevada contribui positivamente no perfil aromático do uísque, proporcionado pela composição química de sua casca. Durante as conversões enzimáticas no processo de elaboração do whisky esta característica é facilmente identificada.
3. Cevada maltada
No Brasil a cevada é utilizada na forma de malte, isto é obtido pela germinação dos grãos de cevada, em condições adequadas de temperatura, umidade e aeração. O processo de maltagem, bastante complexo, é realizado em salas equipadas com sistemas de aeração, ventilação, dispersão e aspersão. Qualquer cereal pode ser transformado em malte, no entanto os mais comuns são da cevada, milho e centeio. Durante a germinação o cereal passa por modificações bioquímicas, onde, uma pequena parte dos carboidratos é consumida como fonte de energia para seu crescimento, daí as diferenças observadas na Tabela 1 entre os teores de amido e açúcares na cevada e na cevada maltada. O objetivo da maltagem é permitir que o cereal desenvolva as enzimas alfa-amilase, maltase, entre outras ou que ative as enzimas beta-amilase que no início estão inativas. A maltagem permite ainda alterações na composição das proteínas e outros componentes do grão, que contribuirá no aroma e flavors (sabor) do whisky. O teor de enzimas é determinado pelo poder diastático, ou diástase. O poder diastático representa o valor numérico da somatória de todas as enzimas com poder sacarificante. Então, quanto maior o poder diastático maior será o nível de enzimas sacarificante e, portanto, maior os níveis de açúcares sacarificados. A classificação e o tipo de enzimas presente no malte será discutido mais adiante. Como já foi dito anteriormente o teor de açúcares sacarificados é de grande importância para as indústrias produtoras de destilados, pois possibilitará menor ou maior rendimento alcoólico, isto é, quanto maior o teor de açúcar maior será o rendimento alcoólico final, em condições adequadas de processo.
4. Maltagem
Como dito anteriormente, qualquer cereal pode ser transformado em malte, no entanto, será discutido aqui apenas a maltagem de cevada por ser o principal cereal utilizado na elaboração de whisky tipo escocês. Na primeira etapa do processo de maltagem os grãos de cevada passam por um sistema de seleção e limpeza. Os grãos são classificados em peneiras, ventiladores e aparelhos magnéticos, para retirada de particulados metálicos entre outros. O cereal classificado é transferido para cubas de absorção contendo água limpa à temperatura entre 10 e 16ºC. Trocas de água ocorrem ocasionalmente, para evitar possíveis contaminações microbiológicas. Este processo leva de dois a três dias, ou até que os grãos atinjam de 44 a 46% de umidade em peso. Quando a umidade necessária é alcançada, o cereal é transferido para as salas de germinação. As salas de germinação são compartimentos rasos munidas de sistemas de aeração, ventilação e dispersão. A dispersão dos grãos tem como finalidade, evitar o entrelaçamento das radículas (pequenas raízes originadas durante a germinação) o que dificultaria a retirada dos grãos germinados. Durante este processo os grãos são revolvidos e a umidade é mantida por adição de água. O processo é interrompido quando as radículas atingem ¾ do comprimento do grão, neste momento o poder diastático alcança um máximo. Os grãos são agora transferidos para estufas de secagem onde são mantidos até que a umidade fique entre 4 e 6% em peso. Durante o processo de secagem a temperatura é cuidadosamente controlada, pois ao contrário poderia danificar as enzimas. Após esta etapa as radículas são extraídas e o malte, denominado “malte verde”, é estocado em silos em condições controladas para aprimorar a qualidade. Conforme pesquisas realizadas em laboratórios, verificou-se que a atividade da enzima alfa-amilase pode ser substancialmente aumentada pela adição de uma solução diluída de ácido giberélico durante a germinação da cevada. O aumento da concentração da enzima traz vantagens para as destilarias, pois tal enzima atua primordialmente no desdobramento da cadeia do amido. O ácido giberélico ocorre naturalmente na cevada em concentrações entre 20 e 160 ppb e é essencial para a síntese de alfa-amilase. Adições entre 0,01 a 1 ppm durante a germinação reduzirá o processo em um dia ou poderá quase que duplicar a concentração de alfa-amilase. A queima de enxofre nas estufas durante a secagem reduz o nível de bactérias e melhora a qualidade do destilado, pois o gás anidrido sulforoso (SO2) inibe o crescimento bacteriológico. A quantidade de enxofre a ser utilizada encontra-se na faixa entre 20 e 40 ppm em base seca de malte. Na Escócia, durante o processo de secagem, faz-se passar pelo malte ar quente e fumaça proveniente da queima de turfas (rochas orgânicas esponjosas, constituídas de restos de vegetais em variados graus de decomposição, e que se formam, normalmente, em regiões pantanosas). Este processo dá ao malte características defumadas. Na verdade o que ocorre é que o malte absorve parte de substâncias fenólicas oriundas da fumaça. Este processo, na produção de whisky é típico da Escócia, pois lá ocorrem grandes formações de turfas. Esta característica de malte defumado é o que diferencia o whisky desta região dos whiskies produzidos em outros países, Irlanda, Brasil entre outros. O malte produzido com este perfil é denominado pitted malt, ou malte turfado. O teor de fenol no produto acabado é de aproximadamente 1 a 3 ppm. Níveis maiores podem ser encontrados nas matérias-primas, mas no produto acabado pode tornar o sabor do whisky um tanto desagradável. Entre os apreciadores é comum classificar o whisky com estas características de smoked whisky.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sr.Blackhorse,
Criei um blog para tratar exclusivamente sobre o mundo do whisky. Chama-se www.whiskymanager.blogspot.com
Gostaria de saber se o sr. conhece algum estudo, literatura que fale sobre a influência de elementos químicos no sabor, aroma e/ou cor da bebida, como por exemplo: a influência do ferro presente na água, ou do cloro,cobre (esse o mais interessante), dióxido de carbono e nitrogênio.
Se puder acessar o meu blog, verás que trato o assunto com seriedade, portanto, se puder me ajudar ficaria imensamente grato.

Cordialmente,

João Marcelo
PS: Parabéns pela qualidade do seu blog.